Com mais de 50 anos de carreira o fotógrafo conhecido como “Operário da Fotografia” conta a sua lendária trajetória e de como suas famosas fotos contribuíram para ficar na memória do Brasil e do mundo
Por: Gabriele Pereira
Nascido em um vilarejo no interior da Bahia, Evandro Teixeira aproximou-se da fotografia ainda na infância. E foi a partir da revista O Cruzeiro, trazida de Salvador pelo pai de um colega, que chamou a atenção do jovem para ingressar em um curso de correspondência oferecido por um dos maiores fotógrafos da revista naquela época, José Medeiros. “Eu sempre tive essa cabeça para a arte e O Cruzeiro me levou a fotografar”.
Após ganhar de presente uma câmera fotográfica do tio, Evandro resolveu estudar em outras regiões da Bahia passando por cidades como: Jequié, Ipiaú e Salvador. Nessas andanças montou um laboratório e conheceu diversos fotógrafos, tais como Walter Lessa, fotógrafo do Jornal de Jequié. “Eu sempre gostei desde pequeno de fotografia de movimento, de cotidiano, de gente, me chamava atenção e o Walter Lessa era isso”. Depois foi convencido pelo compositor Mapim a migrar para a capital do Brasil daquela época, o Rio de Janeiro. “Mapim insistiu tanto que comprei uma passagem e fui com a mala e a coragem para o Rio de Janeiro, com uma carta dele para entregar ao chefe de reportagem da rede dos Associados, de Assis Chateaubriand”.
Em 1957, chegou ao Rio de Janeiro para trabalhar no jornal vespertino O Diário da Noite, onde iniciou o trabalho como fotógrafo casamenteiro. Foi então, que recebeu ordens do chefe do jornal para não fotografar pessoas negras. “O chefe gritava – Oh baiano pode fotografar rico, pobre não importa só não quero preto”. No dia seguinte Evandro saiu de carro com uma lista de igreja na mão a procura de casamento. Na busca pela cerimônia religiosa na cidade, conseguiu achar apenas uma na Gávea, onde se casava uma alemã, loira de olhos claros, com um negro de cabelos black power. Sabendo que não podia fotografar por ordens do patrão, Evandro decidiu tirar a foto e levar para a redação do jornal, onde junto com um laboratorista, embranqueceu o rapaz. O caso deu um problemão e o fotógrafo quase foi demitido, mas teve que sair por uns tempos do jornal. Após o episódio, cobriu desfiles de carnaval e das escolas de samba do Rio de Janeiro.
Ganhando destaque como fotojornalista do vespertino O Diário da Noite, Evandro Teixeira foi convidado para integrar a equipe do noticiário mais aclamado do país, o Jornal do Brasil. Na época o baiano relutou por se achar despreparado para o cargo, mas entrou em 1963 para o jornal, de onde ficou a maior parte da carreira.
No JB, o fotojornalista cobriu copas do mundo, jogos olímpicos, o golpe militar do Chile e do Brasil, a visita do Papa João Paulo II e foi o único a fotografar a morte do poeta chileno Pablo Neruda. Perguntado sobre como conseguiu a façanha de ter sido o único fotógrafo a acompanhar de perto a morte de Neruda, ele respondeu: “É um conjunto de coisas, é experiência, sorte, vivacidade. Ser esperto, sempre acreditei no meu trabalho”. Evandro acompanhou Matilde, viúva do poeta, na preparação do corpo até La Chascona, residência do casal localizada em Santiago, capital do Chile. Assim que chegou, encontrou a casa destruída e no dia seguinte seguiu com o caixão coberto pela bandeira do Chile até o cemitério. “Começou a chegar gente cantando o hino nacional, era uma multidão, pessoas cantando, declamando o poema de Neruda, não aguentei, foi uma emoção”, declarou o fotógrafo.
Depois foi cobrir o suicídio coletivo em Jonestown, na Guiana. Onde o pastor Jim Jones fundou uma seita e conduziu mais de novecentos fies a ingerir um líquido venenoso. O fotojornalista passou uma semana na cidade acompanhando o exército americano fazer a retirada dos corpos.
Evandro Teixeira foi um dos maiores fotógrafos da era militar. Enfrentou a censura, levou porrada, foi preso e viu o Jornal do Brasil ser invadido e fechado por diversas vezes. Uma das fotos mais famosas do movimento estudantil, a Passeata dos Cem Mil foi dele. O “Abaixo a Ditadura – O Povo no Poder” que, inesperadamente, não pôde sair no jornal do dia seguinte, mas foi guardada e publicada no livro Fotojornalismo, anos mais tarde.
E a repressão não acabou por aí, Evandro ainda cobriu a missa de Edson Luís e assistiu ao massacre cometido pela cavalaria contra os estudantes. “Foi um momento glorioso da fotografia, aquilo que se pôde salvar foi maravilhoso para poder contar essa história”.
Como se não bastasse tudo que Evandro fez pela história do Brasil, nos anos de 1990 o fotógrafo registrou os 100 anos de Canudos. “Essa história é fantástica. Canudos é a cidade da minha vó. Eu sou baiano e minha vó era do sertão da Bahia. Li Os Sertões e quando me tornei jornalista pude então, ter a emoção de conviver durante 4 anos com os velhinhos de Canudos, foi sensacional”. Hoje o Operário da Fotografia faz parte dos historiadores de Canudos e religiosamente visita a cidade todo mês de outubro, período em que finalizou a guerra.
O jornalista ainda avalia os avanços tecnológicos na fotografia: “Na época do analógico era muito decisivo, era tudo ou nada. Se você não fizesse naquele momento você não fazia depois. Hoje se tornou muito mais fácil porque a câmera é moderna, dispara um cartão inteiro sem parar”. E pontuou também os momentos mais marcantes de sua profissão que entre várias coisas teve a morte de Pablo Neruda e o massacre no Estádio Nacional no Chile.
Com mais de 50 anos de carreira, Evandro Teixeira tem oito livros publicados, uma biografia e um documentário sobre sua vida e obra. Teve exposições em países como Brasil, Estados Unidos, Alemanha, Itália, Suíça e Cuba. Seu currículo consta na Enciclopédia Suíça de Fotografia junto aos maiores fotógrafos do mundo. Ano passado, foi três vezes a China e foi convidado a participar da Semana de Fotografia Internacional de Beijing.
Além de muitos prêmios que ganhou na carreira, o Operário da Fotografia foi presenteado com o poema Diante das Fotos de Evandro Teixeira, em que tenho o prazer de fechar essa matéria, com pelo menos um trecho “Fotografia: arma de amor, de justiça e conhecimento, pelas sete partes do mundo a viajar, a surpreender a tormentosa vida do homem e a esperança a brotar das cinzas” de Carlos Drummond de Andrade.
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